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  • Década de 80
  • Grandes acontecimentos na informação e no desporto
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Deixámos para trás o ano de 1983, nele se reconhecendo como acumulado o peso de uma gestão que não descartava preocupações quanto ao futuro da RTP, ferido, em demasia, por problemas financeiros intricados. Os dirigentes de topo da empresa reconheciam as dificuldades e os vários diagnósticos que iam fazendo sobre a situação recomendavam não remédios de ataque a males de ocasião mas a esses e aos outros que se perfilavam como compromissos à distância. A administração que Palma-Ferreira liderava era pois confrontada com problemas que se determinara a aceitar, embora e ao que se argumentava, não muito facilitados por um calendário irregularmente cumprido no que respeitava à conta-corrente com o Governo. Por outro lado, que dizer das várias reestruturações produzidas sobre o tecido empresarial; das frequentíssimas movimentações dos quadros dirigentes, sendo que, alguns desempenhavam funções por espaço de tempo irrisório; da ingerência política que, embora nunca declarada, não era nada difícil de perceber que existia; da necessidade de produzir diariamente para a “fornalha” das emissões, mas fazendo-o com qualidade matriz da quantidade e cumprindo um mapa suficientemente diversificado, capaz, quanto possível, de ser estimulador das audiências; do imperativo nacional que estava conferido e legislado para atendimento em permanência à cobertura do território, ou seja, de manter sobre ele um sinal-TV vivo e não descurando o seu alargamento até ao limite.

Um cenário global pouco animador, por certo, mas motivador. Palma-Ferreira tê-lo-á pensado – e ponderado – e daí saiu para uma reflexão partilhada pelos seus colegas de gerência: “O capital de experiência acumulado pela RTP, enquanto empresa de Comunicação, permite avançar com segurança para uma necessária evolução, a processar de uma forma ajustada às realidades de hoje. A evolução é indispensável porque, passada a época do fascínio, o que se exige da Televisão é a prestação de serviços diversificados e a satisfação de interesses colectivos. À gestão rigorosa dos seus recursos, a que uma conjuntura difícil obriga, a RTP não pode impedir, antes aconselha, a que se prepare o futuro mediato – que é o da concorrência, seguramente crescente, e o da multiplicação dos canais de comunicação. A RTP tem de fazer opções a prazo – mas hoje. Opções que têm a ver com o seu enquadramento e fins mas também com a capacidade de gerar, garantir e gerir os meios de que careça para atingir os seus objectivos. Opção a opção, há que ter em conta o que de essencial há na estética, no ritmo e na forma do conteúdo e do meio Televisão.”1 Posto o assunto nestes termos, restava passar à prática e esta era uma nova tentativa – mais uma – para “pensar” a RTP no seu todo e, depois, ver o que dava. De raiz, assim nasceu o “Gabinete de Prospectiva” ao qual se concedeu amplos poderes para ponderar as estruturas de produção, administração e emissão da RTP e propor o que entendesse por conveniente no sentido de “colocá-las ao serviço da criatividade”. “Pretende-se, em primeiro lugar, devolver a empresa aos profissionais de Televisão” – disse Palma-Ferreira no acto de posse dos elementos que integraram o “Gabinete”.2 E precisando ideias: “A reformulação da estrutura geral da RTP, em todas as suas áreas, visa, obviamente, uma política de emissão em dois canais com meios próprios e segundo padrões modernos e eficazes; visa, igualmente, a total reestruturação das áreas de Informação, da concepção da direcção artística e da criatividade, anulando os meios que até agora têm propiciado a improvisação, o favoritismo e o oportunismo, vícios nefastos que afastaram tantos profissionais categorizados e que profundamente concorreram para o desgaste da RTP.” Referindo-se aos métodos de programação, que considerou “convencionalizados por um fatalismo aberrante e anacrónico” disse que eles “serão revistos de modo a que se possam cumprir os desígnios do Conselho de Gerência: oferecer aos portugueses um serviço digno e útil, fortemente apoiado no talento e no génio dos nossos autores e artistas, sem esquecer o Mundo que nos rodeia e que dia-a-dia se transforma. O ´Gabinete de Prospectiva` preparará a RTP para o futuro próximo, adaptando a empresa às exigências da tecnologia dos meios audiovisuais que na Televisão servem o espectáculo, a informação, o noticiarismo e o entretenimento. E tudo isto sem preconceitos de natureza política e sem esquecer que vivemos numa democracia; sem esquecer que devemos cumprir escrupulosamente as regras de convívio que a democracia impõe.” António Botelho, “pioneiro” da RTP, que até então exercera as funções de Director-Coordenador de Produção (depois de o ter sido dos Programas e, antes, durante muitos anos, um técnico fulcral da cenografia televisiva), assumia, com realismo, as responsabilidades que lhe competiam como responsável pelo “Gabinete”, salientando que este iria responder ao desafio que lhe era proposto com “a agressividade de quem defende o que é seu, com a força do apoio que lhe derem, com a aposta no futuro que subscreveu.” E a terminar: “Ninguém projecta a Televisão sozinho; quem o ambicionar fracassa, mas nenhuma equipa a repensa ou organiza sem o suporte da inovação, sem a firma da autoria. O ´Gabinete` agora empossado é uma equipa de profissionais diferenciados, uma referência entre os trabalhadores que são o corpo real da empresa; a inovação será o seu projecto.”

Cinquenta dias depois de empossado, o “Gabinete de Prospectiva” mostrava trabalho. Sobre a mesa do Conselho de Gerência estava o seu primeiro relatório, apontando para uma série de princípios alinhados em duas áreas com necessidade de influência. O documento designava-as por “grandes opções” e “linhas de força” e quem sobre elas se debruçasse com um mínimo de atenção (e interesse) encontraria aí matéria suficiente para alicerçar formas de repensar a RTP. Só que havia sempre pouco tempo na nossa Televisão ou, então, eram as coisas que se estavam a passar com demasiada rapidez. Devia ser isso, sim, porque, na verdade, já se previa (e nem sequer estava longe) a queda de mais um Conselho de Gerência, com todas as implicações que, por arrastamento, daí resultariam, como sempre… E, assim sendo, não era de esperar que o projecto (de princípios bem intencionados, não se duvida) viesse a ter grandes efeitos práticos. Salvo a oportunidade que deu a uns quantos funcionários para, em conjunto, pensarem a RTP, exporem reflexões, trocarem ideias sobre a problemática televisiva.3

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1 Ordem de Serviço nº 7, de 19.2.1984.

2 Eram 14 funcionários da RTP, a maior parte deles com muitos anos de serviço na empresa. Mas só 7 constituíam o “Gabinete”, propriamente dito; aos restantes foram confiadas funções de consultores e assessores. António Botelho era o Director-Coordenador do “Gabinete”, estando na sua equipa Ismael Augusto, João Serradas Duarte, Ver maisAfonso Rato, José Vieira Machado, Fernando Lopes e Octávio Clérigo. O núcleo de apoio contava com Manuel Tinoco de Faria, Afonso Coroado, Manuel Nunes Marques, José Cândido de Sousa, José Nuno Martins, Teresa Olga e Elísio de Oliveira (por impedimento, foi depois substituído pelo engº Hermenegildo Tavares). Para Palma-Ferreira, estes funcionários deveriam ser “verdadeiros intérpretes da isenção, do altruísmo e abnegação que nos deve unir” – palavras ditas na posse, a 19.1.1984. Voltar a fechar

3 Mas há que fazer justiça a este grupo de trabalho, que funcionou, e bem, certamente porque constituído por pouca gente (mas muito qualificada e muito dedicada à empresa) e porque, pela primeira vez em comissões constituídas na RTP para qualquer efeito (e o seu número já não era leve), Ver maissó lá estavam funcionários de carreira, portanto os mais interessados (e preocupados) num futuro comum. Um outro documento gerado pelo “Gabinete de Prospectiva” apontava para alterações ao Estatuto da RTP, no sentido de conduzir a empresa a uma situação de clara autonomia face ao Governo, à semelhança, aliás, do que se passava na generalidade dos países europeus. O projecto previa a existência de um Conselho-Geral e de uma Comissão Administrativa de 7 elementos, sendo que apenas 2 seriam de nomeação governamental. Os restantes 5 seriam indicados pelo Conselho-Geral, um órgão com larga representatividade das estruturas da sociedade portuguesa. Finalmente, refira-se um estudo preliminar, também produzido pelo “Gabinete”, sobre o novo Centro de Produção de Lisboa, muito bem alicerçado e que motivou, nos anos seguintes, os novos desenvolvimentos que António Botelho (entretanto nomeado Director do Gabinete do Novo Centro) levou até ao fim, com grande determinação. Cumpriu o que se lhe pedira, chegou até onde era possível. O resto já não foi com ele. Voltar a fechar

O “Gabinete de Prospectiva” acabaria por se revelar impotente para fazer avançar os seus projectos. No início de Agosto, a maior parte dos seus membros apresentou pedidos de demissão, baseados numa exasperante falta de diálogo com o Conselho de Gerência. A Ordem de Serviço nº 34, de 17.6.1985, dá o Ver mais“Gabinete” como extinto. Voltar a fechar

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